"Exposição Projeto Incêndios", de Miguel Mosquera

A sede do Ecomuseu de Barroso, em Montalegre, irá ter patente a exposição "Exposição Projeto Incêndios", de Miguel Mosquera.
Poderá ser vista de 24 de fevereiro a 28 de abril de 2024.

O contexto

Nas últimas décadas o território galego emerge, junto com a vizinha região do Norte-Centro de Portugal, como uma das regiões da Europa que sofre maior incidência do fogo, tanto a nível de número de incêndios como de área queimada. Notamos as consequências especialmente no sul da nossa comunidade, onde a menor densidade e o envelhecimento da sociedade conduzem ao mesmo tempo a um forte despovoamento.

O fogo é um elemento natural da paisagem, um elemento evocativo e modelador do sistema, mas que, nas condições atuais, aumenta a sensação de ameaça e perigo num contexto de excesso de informação e imediatismo, onde se configura como um elemento de perturbação da paisagem e da sociedade. Hoje, pode ser considerado como o principal elemento desestabilizador a nível ambiental no nosso país.

 

O artista e a exposição

Neste contexto, e a partir dos acontecimentos ocorridos nos últimos anos, mas sobretudo no início do outono de 2017 - de memória desfavorável no nosso território -, o artista Miguel Mosquera (Ourense, 1953) constrói um projecto expositivo em que, seguindo uma estratégia e conceitual heterogênea, mistura de diferentes elementos e texturas, elabora um discurso que navega pelo caminho entre os dados, as formas e os sentimentos despertados em nossa consciência e memória coletiva após a passagem do fogo.

Com uma longa carreira que se inicia no final dos anos sessenta, a obra de Miguel Mosquera tem viajado por diferentes elementos: da pintura à colagem, oferecendo imersões e pontos de vista pessoais, viajando pelos elementos históricos que reflecte. A sua obra combina, com um grande controlo do espaço, a objectividade dos factos, enquanto cónica visual, com a subjectividade das implicações emocionais que esses mesmos factos transmitem, possibilitando um tratamento simbólico dos elementos descritos.

A proposta desta exposição convida a diversas reflexões críticas. Por um lado, abre a porta para repensar a nossa própria relação com o ambiente natural, e também, como não poderia deixar de ser, sobre a forma como nos construímos como sociedade, crescendo de costas para os nossos espaços naturais e promovendo essa dicotomia ilusória humanidade-sociedade. Por outro lado, também aborda aquela contradição óbvia entre o mundo rural e o mundo urbano, destacando aquela contradição endémica entre a cultura tradicional e a cultura contemporânea.

 

A integração do trabalho neste contexto

O contexto ambiental atual convida a uma reflexão lenta sobre o problema, elemento-chave da criatividade artística, mas também do método científico. A capacidade de extrair a essência de uma ideia, de um conceito ou de um dado e dar-lhe forma num processo que reúne elementos cognitivos e sensoriais, é comum a ambas as disciplinas, tão aparentemente opostas a nível formal.

Para além do seu óbvio valor intrínseco, excepcionalidade e individualidade artística, a exposição de Miguel Mosquera representa um complemento perfeito para os dias de hoje. A ideia desta exposição conjunta é aliar a capacidade de sugestão e reflexão da atividade artística à imparcialidade da atividade científica na abordagem dos processos. Atualmente dispomos dos meios, da informação e das capacidades, no entanto, o problema parece longe de estar resolvido. Isso pode ocorrer porque a ciência e a tecnologia atuais não chegam a lugares onde outras linguagens, mais íntimas e pessoais, possam reverberar de maneira diferente no imaginário coletivo.

A nossa relação passada, presente e futura com o fogo faz-nos pensar se este será o momento de mudar a visão tradicional e aprender a conviver com o fogo. Aqui é vital o envolvimento do conjunto da população, pelo que a estratégia geral deverá passar por complementar os meios técnicos com uma perspetiva multidisciplinar. Tendo em conta que devemos atuar em diferentes frentes, é neste momento que se faz presente a transmissão da mensagem num formato diferente, com recurso a uma linguagem artística, com o objetivo de nos fazer refletir sobre a problemática dos incêndios florestais. Esta reflexão, em conjunto com outras iniciativas, pode ajudar a aumentar a sensibilização e o envolvimento social, promover os valores dos sistemas naturais e contribuir para a criação de paisagens mais resistentes ao fogo.

Beatriz Omil, Pablo Souza y Agustin Merino
Departamento de Edafologia e Química Agrícola da Universidade de Santiago de Compostela.